Por Jose Rodrigo Carvalho

Cento e setenta e seis ciclistas, vinculados a vinte e duas equipes, competem no Tour de France.

Na primeira edição do Tour, em 1903, eram cerca de sessenta ciclistas em busca dos prêmios em dinheiro de vencedor por etapas e na classificação geral. Naquela época os ciclistas também corriam por equipes.

Ao longo da história do Tour de France houve oscilação entre a participação de equipes comerciais e equipes nacionais, onde os atletas só podiam correr para representar o seu País.

A participação dos ciclistas no Tour sempre ocorreu através de equipes e nunca individualmente. Atualmente, para que um ciclista profissional possa competir no Tour de France ele deve ser inscrito através de um UCI – Union Cycliste Internationale – WordTeam, que é a categoria das equipes classificadas para competir o UCI WordTour, circuito da elite do ciclismo profissional em provas de etapas ao qual o Tour de France está vinculado.

Ao final da vigésima primeira etapa do Tour de France, na Champs Elysées, em Paris, quem sobe no lugar mais alto do pódio, vestindo uma camisa amarela, é um ciclista campeão geral por tempo. Um atleta e não uma equipe, o que pode parecer uma contradição já que os critérios de participação no Tour são elaborados e aplicados aos times e não aos atletas.

A lógica do ciclismo de estrada em provas por etapas é que as disputas sejam vencidas por um ciclista, que só conseguirá se tornar campeão através do trabalho e ajuda de toda a equipe.

Na prática, e em função do nível diferenciado de alguns ciclistas e times, nem todas as 22 equipes que participam do Tour tem a possibilidade real de brigar pela camisa amarela. As equipes que tem na sua formação algum, ou alguns, destes ciclistas fora da curva, traçam a sua estratégia, e montam os seus times, para que todos os atletas trabalhem com um só objetivo, conduzir o líder da equipe em segurança, com o máximo de economia de energia e rapidez, até a linha de chegada, ou um pouco antes disto (mas o mais próximo dela possível), quando o líder ataca sozinho e decide a prova.

A formação das equipes é composta por diferentes “posições” de ciclistas (como atacante, zagueiro e goleiro no futebol) com papeis e atribuições definidos, e pode variar bastante entre a quantidade e a disposição dos ciclistas em cada uma destas posições.

A principal posição é a do líder/capitão – que é o ciclista com maior chance de ganhar a classificação geral, a camisa verde de classificação por pontos, a camisa branca com bolinhas de campeão por pontos de montanha ou ainda o que tenha a maior chance de ganhar etapas no sprint.

Por exemplo, a equipe Bora-Hansgrohe, foi criada e planejada para trabalhar pelo Peter Sagan, campeão da camisa verde em 7 dos últimos 8 Tour de France e a equipe Lotto Soudal, no Tour 2020, tem como líder o australiano Caleb Ewan, um dos três melhores sprinters da prova.

Os gregários são os ciclistas que tem como função “colocar a cara no vento”, fazer força para puxar os demais membros do time, principalmente o líder, e garantir que ele ande rápido fazendo o mínimo esforço possível, guardando assim energia para ataques decisivos nos momentos certos.

Os carros das equipes acompanham o pelotão em caravana. Para buscar alimentação e hidratação durante as 4/5/6 horas de prova, os ciclistas precisam ir até os carros. Esta também é uma função do gregário.

Documentário Wondrtful Losers: A different world

Há um documentário muito bom chamado “Wonderful Losers: A Different World” que retrata a vida destes ciclistas, gregários, que constroem as suas carreiras no anonimato, com a presença constante do risco de acidente e das dores consequentes do esforço máximo e das inúmeras quedas quase inevitáveis. Os gregários precisam estar bem para andar em alta performance e assim ajudar o time em todas as etapas, mesmo com a consciência de que eventualmente chegará horas depois do primeiro colocado.

Os sprinters também vivem a realidade de chegar com algumas horas de diferença para o camisa amarela, geralmente nas etapas de montanha, mas nas etapas planas a disputa pela vitória do sprinter é o objetivo principal da equipe que trabalha para embalá-lo até o esforço final.

O comprometimento dos atletas com o time é essencial para que a estratégia de formação da equipe funcione, já que a grande maioria dos membros irá sacrificar a sua possível vitória individual pela vitória do ciclista mais bem condicionado da equipe.

Para as equipes que não participam diretamente da briga pela camisa amarela outras estratégias para formação dos times são mais interessantes e podem atrair maior visibilidade para o seu patrocinador, como escalar ciclistas sprinters, que briguem para ganhar etapas, ou ainda atletas que andem bem em clássicas de um dia, que podem escapar sozinhos do pelotão para puxar uma fuga, estampando o nome da equipe, que é o mesmo do principal patrocinador, em posts de todas as mídias que cobrem o Tour, no meu e no seu instagram.

Na disputa da camisa amarela, dos sprints ou dos pontos de montanha, apenas uma minoria dos 176 atletas que participam do Tour de France briga diretamente por uma boa classificação. Todos os demais ciclistas trabalham para que esta minoria dispute na melhor condição e leve o nome do time ao lugar mais alto do pódio e a maior quantidade de pessoas ao redor do mundo.

Talvez a melhor conclusão seja que o Tour de France é uma prova disputada de forma individual por equipes, ou por equipes com vencedores individuais, se é que isso é possível!

Vive le Tour!